Incerteza, um ensaio
Sou particularmente atraído por conteúdos na área de dados que refletem sobre os impactos das tecnologias em nossas vidas, especialmente diante do avanço das ferramentas de inteligência artificial.
Por isso quando tomei conhecimento do livro “Incerteza, um ensaio” do professor e jornalista Eugênio Bucci, eu percebi na hora que havia um enorme potencial. E não me decepcionei. O livro reflete sobre a evolução do conceito da incerteza partindo dos anos 1940 com o surgimento dos computadores e a necessidade de matemáticos e cientistas da computação modelarem matematicamente a incerteza até os dias de hoje. Neste sentido, o livro serve também como guia histórico para entender como o conceito da incerteza evoluiu ao longo das décadas.
É particularmente fascinante como Bucci conta sobre como o grande estalo para modelar a incerteza veio do paralelo com a entropia, um conceito fundamental da física e que serviu posteriormente de base para a teoria da informação de Claude Shannon. Por ser escrito por um jornalista e em formato de ensaio é um livro que pode ser lido e aproveitado tanto por audiências técnicas e não técnicas, outro motivo pelo qual tem minha admiração. Além de ser escrito por um brasileiro em um nicho dominado por livros técnicos e importados.
O argumento de Bucci para os dias atuais é que a incerteza se tornou extremamente lucrativa, principalmente para as big techs. Estas empresas extraem lucros elevados do uso comercial de seus algoritmos caixa preta ao mesmo tempo em que promovem uma lacuna de entendimento por parte dos usuários sobre o funcionamento desses sistemas, evidenciando uma crescente disparidade entre a elite detentora da tecnologia e a grande maioria da população, que enfrenta as consequências da incerteza de forma desvantajosa (para exemplos sobre isso, ver a famosa ted talk de Cathy O’Neil, o filme Coded Bias, ou essa excelente matéria da Vox).
Sendo assim, para Bucci o cerne do problema não reside na tecnologia per se, mas sim nas dinâmicas de propriedade que a cercam, salientando a crescente divisão entre as classes sociais. A elite, detentora e beneficiária da tecnologia, contrasta com a maioria, que sofre com os impactos da incerteza digital.